O assassinato de Vanessa Ricarte, de 42 anos, ontem em Campo Grande, foi o ápice da violência de um homem já conhecido por agens na polícia e um comportamento agressivo contra mulheres. Na lista de vítimas do músico Caio Nascimento, somam-se a mãe, a irmã e ex-namoradas que, assim como a jornalista, procuraram a polícia na esperança de pôr fim aos crimes.
Na certidão estadual de antecedentes criminais, Caio coleciona 16 processos. Um por roubo, outro por um acidente de trânsito, um terceiro por difamação, mas a grande maioria, e o que realmente chama atenção, por violência doméstica. Pelo menos em cinco casos, as vítima pediram medidas protetivas contra ele.
Na lista, não há detalhes dos casos, apenas as datas:
Durante coletiva de imprensa realizada na Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) nesta quinta-feira (13), a delegada Elaine Benicasa afirmou que as vítimas eram ex-namoradas e até a mãe e a irmã de Caio.
Apesar da grande ficha criminal, alguns dos processos ainda estavam em fase de investigação. Mas cada caso, segundo a delegada, mostrava uma personalidade agressiva e perturbada.
“Uma pessoa totalmente perturbada, com agens por roubo, com tentativas de suicídio, e algumas ocorrências de violência doméstica contra a mãe, contra a irmã, contra outras mulheres. Cada caso era diferente, algumas com ameaças, outras com lesões”.
Vanessa procurou a polícia pela primeira vez na madrugada de quarta-feira (12). Em depoimento, relatou sofrer ameaças, contou que era impedida de sair de casa por Caio e ainda que teve fotos íntimas expostas. Assim como as outras vítimas, ela pediu medida protetiva, medida que foi concedida pela justiça em menos de 24 horas, mas não foi o suficiente para salvá-la.
O boletim de ocorrência de Vanessa foi registrado de madrugada desta quarta-feira (12). Na tarde do mesmo dia, por volta das 15 horas, ela voltou à delegacia para saber se a medida protetiva havia sido aceita. Segundo Elaine Benicasa, a jornalista foi atendida pela delegada plantonista.
“Ela informou que a medida protetiva já havia sido autorizada e ofereceu à Vanessa que ela permanecesse no abrigo aqui da Deam até o autor ser intimado, já que ele morava com ela e precisava saber que ali não poderia ficar mais, mas ela afirmou que tinha outro lugar para ficar, que ficaria na casa de amigos”.
Em todo esse processo, Vanessa estava com um amigo e, assim que saíram da delegacia, foram juntos à casa dela, para buscar roupas. No entanto, ao chegarem, encontraram Caio.
A partir desse momento, tudo que a polícia sabe foi descrito pelo amigo de Vanessa. Nas palavras dele, a jornalista pediu que Caio saísse da casa e, aparentemente, ele concordou. A testemunha resolveu ligar para uma outra amiga, para pedir ajuda, avisar que a situação ali estava tensa, e foi nesse segundo, em que tudo parecia “calmo”, que o crime aconteceu.
Caio aproveitou o momento para ir à cozinha, se armou com uma faca e atacou Vanessa. Foram três golpes, todos no abdômen. O amigo da jornalista correu para ajudar. Conseguiu tirá-la de perto do suspeito, a arrastou para um cômodo da casa e se trancou ali com ela.
O suspeito esmurrou a porta, pediu para entrar, ameaçou mais uma vez. Mas depois de um tempo, “se acalmou”, pediu um cigarro e uma bebida. O amigo de Vanessa aproveitou a oportunidade para chamar a polícia.
Polícia Civil e Polícia Militar foram acionadas. Os militares chegaram primeiro e descobriram que o autor do crime estava no andar de cima da casa, trancado. Foram eles que fizeram a prisão em flagrante de Caio.
Vanessa foi socorrida em estado grave, chegou a ser levada para a Santa Casa, mas não resistiu.
Na delegacia, Caio não quis falar, preferiu ficar em silêncio. Os dois moravam juntos há quatro meses e, em dezembro do ano ado, anunciaram que iriam se casar.
Meses depois, diante da recepcionista da Deam, Vanessa falou abertamente que jamais esperava estar ali, na condição de vítima. Para as delegadas, é por isso que ela também acreditou que jamais Caio chegaria ao extremo.
“A vítima não acredita que o autor vai ter coragem. Ela vem, faz o registro do boletim de ocorrência e não acredita que ele vai chegar a esse ato cruel”.
Vanessa era assessora de imprensa do MPT (Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul). Nesta quinta-feira, o órgão público emitiu uma nota de pesar pela morte da jornalista.
“Vanessa Ricarte era uma profissional dedicada e comprometida com a missão institucional do Ministério Público do Trabalho, contribuindo de forma significativa para a divulgação e conscientização sobre os direitos trabalhistas e a Justiça social. Sua perda é um golpe não apenas para a instituição, mas para toda a sociedade, que vê mais uma vida ceifada pela violência de gênero”.